sábado, 24 de julho de 2010

O Softspace e o espaço open source

O espaço pode ser encarado como um computador: possui uma parte rígida, o hardware, e todos os programas que animam essa parte, o software.


O hardware de um espaço pode ser as paredes imóveis, chão e teto. Podemos animar esse espaço, e fazemos isso todos os dias: ouvimos música, cozinhamos, colocamos essências, pintamos e decoramos, adaptamos  e animamos o lugar para atender nossas necessidades e desejos. Essa é a parte que pode ser um software.




O hardspace’ aparece como algo concreto e definido no espaço através de suas propriedades físicas como paredes fixas, chão e teto; mas também como um softspace, que interage com o meio, onde as pessoas são afetadas e também têm efeito sobre ele. O hardspace, porém, pode ditar os processos que podem ocorrer no softspace.

A arquitetura incorpora o meio, e está em constante transformação através de seu uso e reuso.

Não se pode planejar um espaço fechado e empacotado para o usuário. O usuário tem que ser visto no processo como um co-designer - em todos os tipos de obra.


Não somente em obras arquitetônicas, mas em obras artísticas em geral há cada vez mais contestações sobre a supremacia do autor, que controla a sua obra e entrega-a para a sociedade um trabalho fechado e finalizado. Procura-se agora um design open source, onde todos os usuários podem colaborar para a formação do espaço, que já não é mais visto como algo rígido, imutável e permanentemente fixo.


Para saber mais disso, tem um artigo ótimo do Usman Haque aqui, é um texto bem leve. E o site dele é esse.


Não precisamos recorrer à instalações artísticas ou mediarts pra pensar nesse processo. 


Diariamente modificamos o espaço à nossa volta sem perceber. A paisagem sonora é fruto de inúmeros fatores: do hardspace (o espaço imprime sua característica no som, pois o som reverbera, é absorvido, refletido, etc.), dos arredores que podem influir (lembre de seu vizinho agora), dos elementos que estão envolvidos no lugar, e... nós mesmos, por mais silenciosos que tentamos ser. Talvez o fator de que estamos envolvidos no meio sempre é esquecido.








segunda-feira, 19 de julho de 2010

Emoção Art.Ficial 5.0 - BION de Adam Brown e Andrew Fagg


http://www.isisconceptuallaboratory.com/bion.html

Essa obra de Adam Brown e Andrew Fagg é belíssima. Em exposição no Itaú Cultural, em São Paulo, a obra consiste em vários 'bichinhos' que atuam de forma autônoma entre si de acordo com a presença de humanos.

O mais belo é que cada um tem uma resposta diferente. A presença não contamina o todo de uma vez só. A simples presença de alguém consegue transformar as luzes e sons, onde cada elemento influi o outro, como se fosse contando para o outro que alguém passou perto, mudando todo o contexto visual e sonoro. Como um aviso, uma fofoca.

- ". One by one, in rapid succession, bions signal other bions of the stranger and in a wave like pattern become silent. The bions eventually become accustomed to her presence and begin to respond to her as if she was part of their ecosystem. They become attracted to her and glow more intensely when she nears. Eventually, she is incorporated into the dynamic array she once witnessed.


Passada a sensação de 'ameaça', os bions identificam você como parte deles. Daí você pode estar no meio deles, perceber as nuances sonoras que cada um reproduz.
De longe, o som parece uma massa de cigarras biônicas.
Próximo, o som é cheio de fragmentos perceptíveis - o verdadeiro som só é revelado quando você faz parte do ecossistema dos bions!

O site de Adam Brown é por aqui.

O site da exposição é por aqui. Vale dizer que é gratuita, só deixa a desejar porque não se pode filmar ou tirar fotos. É até dia 05 de setembro.

sábado, 17 de julho de 2010

Imersão e apercepção

“Uma das funções sociais mais importantes do cinema é criar um equilíbrio entre o homem e a aparelho. O cinema não realiza essa tarefa apenas pelo modo com que o homem se representa diante do aparelho, mas pelo modo com que ele representa o mundo, graças a esse aparelho. Através dos seus grandes planos, de sua ênfase sobre pormenores ocultos dos objetos que nos são familiares, e de sua investigação dos ambientes mais vulgares sob a direção genial da objetiva, o cinema faz-nos vislumbrar, por um lado, os mil condicionamentos que determinam nossa existência, e por outro assegura-nos um grande e insuspeitado espaço de liberdade.” (BENJAMIN, 1996)
           
O assistir imagens em movimento acompanhadas por sons: uma caverna escura, com uma fonte de luz que reproduz em uma parede imagens em movimento do mundo exterior, que tem seus sons ecoados dentro da caverna, parecendo sair das próprias imagens. Para Arlindo Machado (1997), no mito da caverna de Platão, o mundo dentro da caverna não é um produto do mundo exterior de luzes, mas também um mundo construído e modificado pelos forjadores. Baudry (apud Machado 1997, 43) discorre que os efeitos ideológicos produzidos pelo aparato técnico da sala de cinema – o projetor, a sala escura e a tela – completa a mise en scène da caverna, com imersão do espectador ao mundo apresentado através das imagens na tela. Na sala de projeção as perturbações visuais e auditivas não provenientes do filme são atenuadas, colaborando para um isolamento do espectador. A fluidez do filme está nesse convite à imersão, para qual os sons têm grande importância.
Desde as primeiras projeções cinematográficas, notou-se necessária a ambientação sonora para melhor imersão do espectador na narrativa. Desde os primórdios do cinema havia o desejo e a tentativa de unir o som às imagens da tela: narradores, dublagem ao vivo atrás das telas, partituras específicas para serem tocadas junto a determinados filmes, dentre outros. A presença de sons referentes à imagem sempre foi requerida, também no cinema silencioso.
O som no audiovisual não deve ser entendido ou tratado somente como um acessório, mas também um membro que faz parte de um todo orgânico e responsivo. O sonoro também traz “uma nova dimensão da imagem visual, um novo componente”, o som faz ver na imagem algo que não surge livremente (DELEUZE, 2007. p. 269.). Variadas formas de construção sonora conseguem levar informações importantes ao espectador, não somente através da maneira clara do diálogo, mas também através de outros elementos sonoros. Os componentes sonoros de uma trilha sonora podem ser divididos em ambiências, falas, ruídos, efeitos e música, e podem ser mais ou menos distinguidos entre uns e os outros. Todos os componentes sonoros são misturados, onde um é controlado pelo outro, formando a ilusão de unidade sonora. Todos esses elementos podem ser independentes entre si, suprirem-se ou se transformarem (DELEUZE, 2007): e a parceria com a imagem ganha vários sentidos conforme o momento.

BENJAMIN, Walter. “A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica”. A Idéia do Cinema. (José Lino Grünnewald, org.) Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. Texto originalmente publicado em 1955.


DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo. São Paulo: Editora Brasiliense, 2007.
MACHADO, Arlindo. Pré-cinemas e Pós-cinemas. 1ª edição. Coleção Campo Imagético. Campinas: Editora Papirus, 1997.